OS HOMENS NÃO APRENDERAM

Ary Brasil Marques
A Internet nos proporciona fazer uma análise das promessas feitas e da cobrança mais tarde da efetivação ou não dessas promessas.
Em junho de 1992, no Rio de Janeiro, houve uma conferência internacional destinada a tomada de posição dos diversos países na defesa da ecologia e do meio ambiente.
Naquela oportunidade, uma menina de 13 anos, Severn Cullis-Suzuki, compareceu no plenário juntamente com um grupo de crianças canadenses, e ali fez um discurso comovente que foi um verdadeiro libelo contra a inércia e a ineficácia das medidas que o ser humano estava tomando em relação ao assunto.
O discurso de Severn foi tão contundente e oportuno que o vídeo desse pronunciamento está sendo distribuído nos dias de hoje na Internet.
Disse ela que estava lutando pelo seu futuro, pelo futuro das crianças do mundo inteiro. Falou não ter garantia quanto ao futuro, e que isso não era a mesma coisa que perder uma eleição ou alguns pontos na bolsa de valores. Ela falou em nome das gerações que estão por vir. Procurou defender as crianças que passam fome pelo mundo e que não têm os seus apelos ouvidos. Lembrou das incontáveis espécies de animais que estão morrendo em todo o planeta e disse ter medo de tomar sol por causa dos buracos na camada de ozônio. Nos disse Severn que tinha medo de respirar o ar repleto de substâncias químicas que o estão contaminando. Contou que costumava pescar em Vancouver com o seu pai até o dia que eles pescaram um peixe com câncer. Falou de animais, plantas, florestas que estão sendo destruídos e extintos em todo o planeta.
Disse Severn que sempre sonhara com grandes manadas de animais selvagens, selvas e florestas tropicais repletas de pássaros e de borboletas. E perguntou, será que os meus filhos vão ver tudo isso?
Mencionou o fato de ser apenas uma criança, que não tinha as soluções para esses problemas. Mas afirmou para os membros do plenário que eles também não tinham as soluções, que eles não sabiam como acabar com o buraco na camada de ozônio nem poderiam ressuscitar os animais extintos. Mas falou de modo firme, se vocês não podem recuperar nada disso, por favor, parem de destruir!
Aqui, falou ela, vocês são os representantes de seus governos, homens de negócios, administradores, jornalistas ou políticos; mas, na verdade, vocês são mães e pais, irmãs e irmãos, tias e tios. E todos, também, são filhos.
Embora uma criança, mostrou Severn que todos nós pertencemos a uma sólida família de 5 bilhões de pessoas; e que, ao todo, somos 30 milhões de espécies compartilhando o mesmo ar, a mesma água e o mesmo solo. Governo algum, nenhuma fronteira, poderá mudar esta realidade.
Disse que no seu país se gera muito desperdício. Compramos e jogamos fora, compramos e jogamos fora, compramos e jogamos fora…Falou que lá, no Canadá, eles têm uma vida privilegiada, com fartura de alimentos, água e moradia. Disse que têm relógios, bicicletas, computadores e aparelhos de TV.
Falou das crianças abandonadas nas ruas do Brasil. Comentou que uma delas lhe falou que gostaria de ser rica para dar às outras crianças de rua alimentos, roupas, remédios, moradia, amor e carinho. E analisou o fato dos que têm, serem egoístas e mesquinhos, em comparação a essa criança que não tem nada mas tem amor.
Ela mencionou o fato da grande diferença que era o fato de nascer em lugar que tem tudo. Disse que poderia ser uma das crianças que vivem nas favelas do Rio, ou uma criança faminta da Somália, ou uma vítima da guerra no Oriente Médio; ou, ainda, uma mendiga na Índia.
Disse uma vez mais que ela era apenas uma criança. Mas que sabia que se todo o dinheiro gasto nas guerras fosse utilizado para acabar com a pobreza, para achar soluções para os problemas ambientais, que lugar maravilhoso a Terra seria!
Terminou dizendo que os adultos ensinaram às crianças, desde a escola, a não brigar com os outros, a resolver suas coisas da melhor maneira, a arrumar as suas bagunças, a não maltratar outras criaturas e a não ser mesquinhos. Então por que vocês fazem justamente o contrário do que nos ensinaram?
Disse-lhes para não se esquecerem do motivo de estarem assistindo estas conferências e para quem estão fazendo isso. Lembrou que eles estavam decidindo em que tipo de mundo viveriam seus filhos. Falou que não acreditava que eles pudessem dizer que tudo iria ficar bem, pois nós estamos em suas listas de prioridades?
Completou dizendo: Vocês, adultos, dizem que nos amam…Eu desafio a vocês: por favor, façam com que suas ações reflitam as suas palavras.
Fazem 15 anos que Severn proferiu o seu discurso. Fomos conferir. Hoje, 15 anos depois, milhões de crianças já morreram de fome após essa data. Milhares de florestas foram queimadas, centenas de espécies de aves e de animais foram extintos, crianças vivem em condições sub-humanas nos países subdesenvolvidos, a poluição aumentou tremendamente, o buraco na camada de ozônio cresceu, os políticos do mundo inteiro dão prioridade aos interesses pessoais, a corrupção aumentou, a fome também, as desigualdades sociais formam um abismo entre a maioria da população e uma minoria privilegiada.
Caso Deus olhasse para a Terra, acredito que Ele poderia dizer o seguinte:- “Filhos amados, dei a vocês a inteligência. Dei um paraíso para vocês viverem, cheio de luz e calor, rios e florestas, montanhas verdejantes, cachoeiras, miríades de pássaros e de flores, animais, jardins, mares, lagos, crianças cheias de alegria e de doçura, um mundo maravilhoso. O que vocês fizeram de tudo isso? Caso continuem, dia virá que vocês terão perdido o paraíso que lhes dei, e, o que é pior, vocês acabarão por se auto destruírem.”

SBC, 16/06/2007.