Léon Denis
Léon Denis nasceu numa aldeia chamada Foug, situada nos arredores de Tours, em França, a 1 de Janeiro de 1.846, numa família humilde. Cedo conheceu, por necessidade, os trabalhos manuais e os pesados encargos da família.
Não era seu hábito desperdiçar um minuto sequer de seu tempo, com distrações frívolas, às quais a maior parte dos homens recorre para matar as horas. Desde os seus primeiros passos neste mundo, sentiu que os amigos invisíveis o auxiliavam.
Ao invés de participar em brincadeiras próprias da juventude, procurava instruir-se o mais possível.
Lia obras sérias, conseguindo assim, com esforço próprio desenvolver a sua inteligência. Tornou-se um autodidata sério e competente. Aos 12 anos concluiu o curso primário, mas a situação modesta da sua família não lhe permitiu grandes estudos.
Desde cedo teve problemas de saúde física: com os olhos principalmente. Aos 16 anos salientou-se como um dos melhores oradores e ardente propagandista.
Aos 18 anos tornou-se representante comercial da empresa onde trabalhava, fato que o obrigava a viagens constantes, situação que se manteve até à sua reforma e manteve ainda depois por mais algum tempo.
Adorava a música e sempre que podia assistia a uma ópera ou concerto. Gostava de dedilhar, ao piano, árias conhecidas e de tirar acordes para seu próprio devaneio.
Não fumava, era quase exclusivamente vegetariano e não fazia uso de bebidas fermentadas. Encontrava na água a sua bebida ideal.
Era seu hábito olhar, com interesse, para os livros expostos nas livrarias. Um dia, ainda com 18 anos, o chamado acaso fez com que a sua atenção fosse despertada para uma obra de título inusitado. Esse livro era “O Livro dos Espíritos” de Allan Kardec.
Dispondo do dinheiro necessário, comprou-o e, recolhendo-se imediatamente ao lar, entregou-se com avidez à leitura. O próprio Denis disse: “Nele encontrei a solução clara, completa e lógica, acerca do problema universal. A minha convicção tornou-se firme. A teoria espírita dissipou a minha indiferença e as minhas dúvidas”.
O seu espírito, nessa hora, sentiu-se sacudido em face dos compromissos assumidos no Espaço, para iniciar, em breve, o trabalho de propagação das verdades Kardecianas. “Como tantos outros” – disse ele – “procurava provas, fatos precisos, de modo a apoiar a minha fé, mas esses fatos demoraram muito a chegar. A princípio insignificantes, contraditórios, mesclados de fraudes e mistificações, que não me satisfizeram, a ponto de, por vezes, pensar em não mais prosseguir as minhas investigações. Mas, sustentado, como estava, por uma teoria sólida e de princípios elevados, não desanimei. Parece que o invisível deseja experimentar-nos, medir o nosso grau de perseverança, exigir certa maturidade de espírito antes de entregar-nos aos seus segredos”.
Encontrava-se nos seus trabalhos de experimentações, quando importante acontecimento se verificou na sua vida: Allan Kardec viera passar alguns dias na pacata cidade de Tours, com seus amigos. Todos os espíritas tourenses foram convidados a recebê-lo e a saudá-lo.
As viagens eram para ele uma fonte de alegria e de aprendizado. Em França e no estrangeiro aproveitava as oportunidades que poderiam enriquecer materialmente o patrão sem desprezar tudo o que poderia contribuir para o conhecimento próprio.
Interessavam-lhe as praças, os monumentos, o povo, os hábitos, os costumes e a meditação entre os velhos caminhos das montanhas. Delicia-se com os bosques, com os rios e os lagos. Estas longas horas de meditação solitária no seio da Natureza conduziram-no a uma mais completa compreensão de Deus.
Em 1.880, pelas cidades e vilas que percorria, por força dos seus afazeres profissionais, pronunciava conferências e fundava círculos e bibliotecas populares. É incalculável o número de conferências por ele proferidas em França, no propósito de propagar a “Liga de Ensino”, fundada por Jean Macé.
Na Argélia, onde esteve várias vezes em serviço, também desenvolveu uma intensa atividade de divulgação doutrinária.
O ano de 1.882 marca, em realidade, o início do seu apostolado, durante o qual teve que enfrentar sucessivos obstáculos: o materialismo e o positivismo que olham para o Espiritismo com ironia e risadas e os crentes das demais correntes religiosas, que não hesitam em aliar-se aos ateus, para o ridicularizar e enfraquecer.
Léon Denis porém, como bom paladino, enfrenta a tempestade. Os companheiros invisíveis colocam-se ao seu lado para o encorajar e exortá-lo à luta. “Coragem, amigo” – diz-lhe o espírito de Jeanne – “estaremos sempre contigo para te sustentar e inspirar. Jamais estarás só. Meios ser-te-ão dados, em tempo, para bem cumprires a tua obra”.
A 2 de Novembro de 1.882, dia de Finados, um evento de capital importância produziu-se na sua vida: a manifestação, pela primeira vez, daquele Espírito que, durante meio século, havia de ser o seu guia, o seu melhor amigo, o seu pai espiritual – Jerónimo de Praga – que lhe disse: “Vai meu filho. Pela estrada aberta diante de ti. Caminharei atrás de ti para te sustentar”. E como Léon Denis indagasse se o seu estado de saúde o permitiria estar à altura da tarefa, recebeu esta outra afirmativa: “Coragem, a recompensa será mais bela”.
A partir de 1.884, achou conveniente fazer palestras visando à maior difusão das ideias espíritas.
Escreveu, em 1.885, o trabalho “O Porquê da Vida”, no qual explica, com nitidez e simplicidade, o que é o espiritismo.
Em 1892, recebeu um convite da duquesa de Pomar, para falar de espiritismo na sua residência, numa dessas manhãs célebres, em que se reunia quase toda a Paris. Ele ficou indeciso e temeroso. Depois de muito meditar as responsabilidades, aceitou o convite. “Le Journal” de Paris publicou, acerca da reunião na casa da duquesa, a seguinte notícia: “A reunião de ontem, para ouvir a conferência de Léon Denis sobre a Doutrina Espírita, foi uma das mais elegantes. De uma eloquência muito literária, o orador soube encantar o numeroso auditório, falando-lhe do destino da alma, que pode, diz ele, reencarnar até à sua perfeita depuração. Ele possui a alma de um Bossuet e soube criar um entusiasmo espiritualista”.
O êxito do seu livro “Depois da Morte” situara-o como escritor de primeira ordem.
Os grandes jornais e revistas ecléticas solicitavam-no e as tiragens sucessivas desse livro esgotavam-se rapidamente.
A principal obra literária de Denis foi a concernente ao Espiritismo, mas escreveu, outrossim, segundo o testemunho de Henri Sausse, várias outras, como: Tunísia, Progresso, Ilha de Sardenha, etc., certamente fruto das suas memórias de viagem.
A partir de 1.910, a visão de Léon Denis foi, dia a dia, enfraquecendo. A operação a que se submetera, dois anos antes, não lhe proporcionara nenhuma melhora, mas suportava, com calma e resignação, a marcha implacável desse mal que o castigava desde a juventude. Aceitava tudo com estoicismo e resignação. Jamais o viram queixar-se.
Todavia, bem podemos avaliar quão grande devia ser o seu sofrimento. Mantinha volumosa correspondência. Jamais se aborrecia. Amava a juventude, possuía a alegria da alma. Era inimigo da tristeza. O mal físico, para ele, devia ser bem menor do que a angústia que experimentava pelo fato de não mais poder manejar a pena. Secretárias ocasionais substituíam-no nesse ofício. No entanto, a grande dificuldade para Denis, consistia em rever e corrigir as novas edições dos seus livros e dos seus escritos. Graças, porém, ao seu espírito de ordem e à sua incomparável memória, superava todos esses contratempos, sem molestar ou importunar os amigos.
Depois da morte da sua genitora, uma empregada cuidava da sua pequena habitação. Ele só exigia uma coisa: o absoluto respeito às suas numerosas notas manuscritas, as quais ele arrumava com meticulosa precaução. E foi justamente por causa dessa sua velha mania que a duquesa de Pomar o denominara “o homem dos pequenos papéis”.
Em 1.911, após despender não pequeno esforço, no preparo da nova edição d’ “O Problema do Ser, do destino e da Dor”, ficou gravemente doente com uma pneumonia; foi o tratamento atempado do seu médico que, num curto espaço de tempo, o colocou de novo em pé.
Contudo uma grande e profunda dor lhe estava reservada: veio a Guerra de 1.914-18 e o seu espírito condoía-se ao ver partir para a frente de batalha a maioria dos seus amigos.
Léon padecia, então, de uma doença intestinal e estava parcialmente cego. Pela incorporação, os seus amigos do Espaço e, entre eles, um Espírito eminente, comunicavam-lhe, de tempos em tempos, as suas opiniões sobre essa terrível guerra, considerada nos seus dois aspectos: o visível e o oculto.
Estas comunicações levaram-no a escrever um certo número de artigos, publicados na “Revue Spirite”, na “Revue Suisse des Sciences Psychiques” e no “Echo Fid”, onde transparece, dentro da lei de causa e efeito, o seu grande amor pela terra onde nasceu.
Quando a Guerra se aproximava do fim, a “Revue Spirite” passou a publicar, em todos os seus números, artigos de Léon Denis.
Após a 1.ª Grande Guerra, aprendeu braile, o que lhe permitiu fixar no papel os elementos de capítulos ou artigos que lhe vinham ao espírito, pois, nesta época da sua vida, estava, por assim dizer, quase cego.
Em 1.915 iniciava ele uma nova série de artigos, repassados de poesia profunda e serena, sobre a voz das coisas, preconizando o retorno à Natureza. Nesta época, um forte vento soprava contra o Kardecismo. O fenomenismo metapsiquista espalhava aos quatro ventos a doutrina do filósofo puro. P. Heuzé fazia muito barulho através do “L’Opinion”, com as suas entrevistas e comentários tendenciosos. Afirmava, prematuramente, que, à medida que a Metapsíquica fosse avançando, o Espiritismo iria, a par e passo, perdendo terreno. A sua profecia, no entanto, ainda não se realizou.
Após a vigorosa resposta de Jean Meyer na “Revue Spirite”, Léon Denis por sua vez, entrou na discussão, na qualidade de presidente de honra da União Espírita
Francesa, numa carta endereçada ao “Matin”, na qual estabelecia, com admirável nitidez, a diferença entre Espiritismo e Metapsiquismo.
A partir desse momento, Léon Denis teve que exercer grande atividade jornalística para responder às críticas e ataques de altos membros da Igreja Católica, saindo-se, como era de esperar, de maneira brilhante.
Em Março de 1.927, com 81 anos de idade, terminara o manuscrito que intitulou de “O Gênio Céltico e o Mundo Invisível”. Neste mesmo mês a “Revue Spirite” publicava o seu derradeiro artigo.
Terça-feira, 12 de Abril de 1.927 pelas 13 horas, respirava Denis com grande dificuldade. A pneumonia atacava-o novamente. A vida parecia abandoná-lo, mas o seu estado de lucidez era perfeito. As suas últimas palavras, pronunciadas com extraordinária calma, apesar da muita dificuldade, foram dirigidas à sua empregada Georgette: “É preciso terminar, resumir e.. concluir”. Fazia alusão ao prefácio da nova edição biográfica de Kardec. Neste preciso momento, faltaram-lhe completamente as forças, para que pudesse articular outras palavras. Às 21 horas o seu espírito alou-se. O seu semblante parecia ainda em êxtase.
As cerimônias fúnebres realizaram-se a 16 de Abril. A seu pedido, o enterro foi modesto e sem o ofício de qualquer Igreja confessional. Está sepultado no cemitério de La Salle, em Tours.
Abaixo, alguns livros de Léon Denis:
– CRISTIANISMO E ESPIRITISMO (Editora FEB);
– DEPOIS DA MORTE (Editora FEB);
– ESPÍRITOS E MÉDIUNS (Editora CELD);
– JOANA D’ARC, MÉDIUM (Editora FEB);
– O ESPIRITISMO NA ARTE (Editora FEB);
– O PORQUÊ DA VIDA (Editora FEB);
– O PROBLEMA DO SER, DO DESTINO E DA DOR (Editora FEB);
– SOCIALISMO E ESPIRITISMO (Editora “O Clarim”).
Texto de José Basílio, baseado no livro “Páginas de Léon Denis” de Sylvio Brito Soares.